No último Sábado, dia 02 de Novembro, foi o começo de um dos acontecimentos mais esperados do rugby, os internacionais de outono. Conhecido também como testes de novembro ou de fim de ano, essa tradição anual reúne os hemisférios norte e sul em uma disputa épica. Nós precisamos ressaltar a nossa hermana, Argentina, que é a nossa representante latinoamericana no evento e vai ter a sua estreia esse ano no próximo sábado, dia 09 de Novembro. Antes de formalizar o convite para sentar-se no sofá, assistir e torcer, vamos falar sobre como esse esporte inglês cruzou o Oceano Atlântico e chegou na Argentina com alguns destaques.
Rugby na Inglaterra
Dizem que o rugby foi criado por um estudante, William Webb Ellis em 1823 na escola pública, Rugby School. em Warwickshire. Durante um jogo de futebol, o próprio decidiu pegar a bola com as mãos e correr com ela. Embora haja poucas evidências para apoiar essa teoria, foi dali que o jogo foi ganhando forma com o desenvolvimento de regras e formação de órgãos reguladores.
O rugby rapidamente se consolidou como um dos esportes mais significativos na promoção do ideal de masculinidade imperial inglesa e, posteriormente, britânica. O esporte logo transcendeu suas fronteiras iniciais, sendo adotado nas colônias e territórios britânicos como um poderoso meio de reforçar ideais de disciplina, lealdade e coragem — valores fundamentais na formação do “homem imperial”.
À medida que o século XIX avançava, o rugby passou a ser associado a atributos como altruísmo, coragem, trabalho em equipe e autocontrole. Era visto não apenas como um jogo, mas como um veículo de desenvolvimento moral e físico, promovendo ideais que uniam educação e masculinidade de uma classe dirigente em ascensão. Nos anos finais do século, o rugby começou a se espalhar pelo norte do Reino Unido, ganhando popularidade nas comunidades industriais e se estabelecendo como um esporte central na vida social e cultural de muitos, especialmente nas regiões de Yorkshire e Lancashire.
Essa ascensão culminou na formação de ligas e clubes que formalizaram o esporte, solidificando seu lugar na identidade britânica. Assim, o rugby tornou-se não apenas uma paixão nacional, mas um símbolo de um novo tipo de masculinidade, em um período em que a Grã-Bretanha se afirmava como uma potência mundial.
Como o Rugby Se Ressignificou nas Colônias Inglesas
Na África do Sul, o rugby se tornou um símbolo do apartheid, regime de segregação racial que impediu a participação de diferentes raças em esportes de 1948 a 1994. O Springbok, antílope nativo, representava a exclusão de jogadores não brancos e os valores africâneres, e seus primeiros 90 anos foram dominados por brancos. O Movimento Anti-Apartheid organizou manifestações contra as turnês dos Springboks, resultando na exclusão da África do Sul das duas primeiras Copas do Mundo de Rugby, em 1987 e 1991. A participação do país na Copa de 1995, sob a liderança de Nelson Mandela, o primeiro presidente negro da África do Sul, foi marcante. Ele entrou em campo com a camisa número 6 dos Springboks, um gesto que simbolizou a unidade e o início da reconciliação em uma nação ainda dividida.
Na Austrália e na Nova Zelândia, o colonialismo europeu resultou na perda de terras, cultura e direitos dos povos aborígenes, que enfrentaram condições precárias e isoladas. Políticas opressivas restringiam seu movimento e participação na sociedade. Nesse contexto, o rugby emergiu como uma forma de resistência e organização comunitária, permitindo que os aborígenes se unissem e fortalecessem sua identidade cultural em busca de melhores condições de vida. Essa relevância se reflete nos jogos atuais, onde rituais antes das partidas simbolizam representatividade e orgulho para a comunidade aborígene.
Como o Rugby se Diversificou na Argentina:
A Argentina é o local aonde tem a maior comunidade escocesa fora dos países anglófonos. Após o fim das Guerras Napoleônicas em 1815, soldados e marinheiros desmobilizados, incluindo muitos escoceses, se dirigiram para ajudar os revolucionários da América Latina em sua luta pela liberdade contra a Espanha. A saída da Espanha removeu as restrições à imigração, resultando em um influxo de passageiros e investidores escoceses na região. Já em 1825, por exemplo, navios como o Norval, o Symetry e o Harmony zarparam rumo à Argentina, trazendo escoceses que eram pedreiros, fabricantes de ferramentas, ferreiros, agricultores e outros artesãos qualificados. Os escoceses que migraram para a América Latina buscavam oportunidades econômicas e ascender socialmente em um novo ambiente. A América Latina oferecia a promessa de um futuro mais promissor em comparação com as limitações que muitos enfrentavam na Escócia, especialmente após os desafios enfrentados após as Guerras Napoleônicas.
Com eles, os escoceses são os nomes responsáveis por trazer o rugby e futebol para as terras argentinas. A partida entre os trabalhadores das ferrovias o apresentaram aos estudantes argentinos. Rapidamente se espalhou pelo país entre os locais em colégios, universidades e clubes de elite da capital nacional, em instituições que hoje têm mais de 100 anos. Naquela época, o rugby era amador. Sua popularidade se deu após a primeira vitória internacional contra o Chile em 1950, apesar de terem a sua grande estreia em 1910. Apesar de ser preciso realçar que o rugby é ofuscado pelo futebol.
Hoje, o mundo do rugby está mudando. Com mais portas se abrindo para aqueles que emigraram para países onde o rugby já é profissional há alguns anos e nos últimos 20 anos surgiu uma vertente mais social e inclusiva no rugby. Com clubes em bairros de baixa renda, a participação cada vez mais ativa de mulheres e até comunidades indígenas.
Los Pumas
Desde o primeiro torneio em 1987, a Argentina participou de todas as Copas do Mundo de Rugby e é considerada, de longe, a equipe mais forte da América, mantendo-se invicta contra todas as seleções, exceto o Canadá, contra o qual sofreu duas derrotas. A Argentina alternou camisetas azuis e brancas em seus primeiros jogos internacionais, até enfrentar os British Lions, quando vestiu uma camiseta listrada de azul claro e branco que se tornou icônica. O mascote da equipe foi escolhido em 1941, inicialmente como um leão, mas foi substituído pelo jaguar, uma espécie nativa argentina, devido à sua agilidade e coragem. O apelido “Pumas” surgiu de um erro de Carl Kohler, jornalista do Die Transvaler, que tentou criar um apelido chamativo durante a primeira turnê da equipe como os seus adversários.
Para nós, brasileiros, jaguar é a onça-pintada. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, usaram “onça” para se referir ao lince europeu, vindo do latim luncea. Os tupis chamavam o jaguar de ya’wara, que não colou por aqui porque significava apenas “fera” e acabou sendo usado para os cachorros trazidos pelos portugueses, resultando em “jaguara” para vira-latas. Para evitar confusões, preferiu-se o termo europeu. Contudo, em algumas regiões do Brasil, Paraguai e Argentina, “jaguar” quase pegou, transformando-se em “jaguaretê”, que significa “fera verdadeira”, usada pelos guaranis para diferenciar a poderosa onça de outros animais.
Onça-pintada é a rainha da floresta. Para muitos povos indígenas, a onça é vista como a guardiã da floresta, simbolizando força, agilidade e sabedoria. Sua presença representa a força da natureza e a importância da harmonia com ela. Considerada um totem e espírito protetor, a onça é homenageada em rituais e visões dos xamãs, guiando e oferecendo força às comunidades, presentes em histórias e lendas de geração após geração. No entanto, a expansão das atividades humanas e a destruição de habitats ameaçam tanto as onças quanto os povos indígenas. A luta pela preservação da floresta está intrinsecamente ligada à proteção da onça e das culturas indígenas, ressaltando a conexão entre natureza e humanidade.
Assim como o rugby, nós aqui na Somos valorizamos acreditamos na força da conexão entre as culturas. Quer saber mais sobre essas inesperadas fusões? Inscreva-se em nossa newsletter para ficar por dentro de novidades, dicas, conteúdos exclusivos e tudo o que envolve essa fascinante cultura que ainda nos surpreende!